A TÁTICA E OS MALES DA DUBIEDADE

Valter de Oliveira

Pouco depois da Conferência da ONU sobre os direitos das mulheres, realizada em Pequim, em 1995, participei de uma palestra na USP na qual se explicou o papel do Brasil na elaboração e aprovação das medidas tomadas. Um representante brasileiro, se não me engano um diplomata, narrou algumas dificuldades que tiveram que enfrentar.

É sabido que o documento final avançou na pauta dos chamados direitos das mulheres. Não tanto quanto certos movimentos feministas e nossos representantes queriam. Tiveram que enfrentar dois adversários de peso: O Vaticano e os muçulmanos. O representante da Santa Sé, sagaz e combativo, punha obstáculos à ideologia de gênero e ao aborto, atraindo países para o seu lado.  Resultado: o documento apresentado para votação corria o risco de não ser aprovado (1).

E o que aconteceu?

Jhonatan Queiros — Não há pior inimigo que um falso amigo.

Nosso diplomata explicou a contribuição da delegação brasileira.  Com boa dose de alegria, diria até deleite, ele disse mais ou menos o seguinte:

Diante do impasse pedimos para rever o texto e o reescrevemos. Tiramos alguns pontos mais explícitos do que queríamos e, em vários outros, adotamos uma linguagem ambígua. Ficou mais difícil para o delegado do Vaticano combate-la, atraímos bom número de países. As teses feministas mais radicais foram rejeitadas, mas elas perceberam que a linguagem era suficientemente fluida para que pudessem atuar melhor em seus países.

Como disse não transcrevo aqui as palavras literais do palestrante, daí não te-las colocado entre aspas. Garanto que reproduzi o essencial. Por outro lado não tenho como garantir que nossa delegação teve a importância que nosso representante procurou dar. Destaco apenas o que me chamou mais a atenção: o papel da dubiedade na manipulação de leis e declarações.

Em artigos anteriores citei casos de como isso aconteceu entre nós por ocasião da elaboração da Constituinte. Dou dois exemplos:

  1. Bernardo Cabral, relator da Constituinte, em um dos primeiros “rascunhos” da Constituição, escreveu que “o casamento era a união de duas pessoas”. Obviamente era uma brecha para futura aprovação da união homossexual. Houve reação. O texto foi refeito: “o casamento é a união estável do homem e da mulher”. Levado à votação foi aprovado. Parecia termos escapado. Puro engano. Apesar de aqui ficar bem clara a intenção do legislador o STF, recentemente, reinterpretou o texto e aprovou a união homo afetiva. Nossos ministros simplesmente  esqueceram o positivismo jurídico e o chamado legalismo. Legalismo contudo, utilizado tranquilamente em outras decisões do nosso   Tribunal Superior.
  2. Outro ponto importante que foi colocado na constituição está no art.3°, IV, dos Princípios Fundamentais: “promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação. Comentei com um amigo de Faculdade: abriram as portas para o homossexualismo (e outras coisas) (2). Ele achou que era exagero meu…

Depois de alguns anos a frase passou a ser amplamente usada por partidos de esquerda (e até por libertários) para enfiar goela a dentro da sociedade toda a agenda LGBT. Lembremos que foi proposta do PT na última eleição presidencial até mesmo cotas para incluí-los em toda forma de trabalho e em todas as instituições. Imagine uma empresa que seja obrigada a empregar 5 ou 10% de homossexuais. São loucuras cartesianas típicas dos engenheiros sociais da esquerda que querem um mundo à sua imagem e semelhança.

E o que deveria ter sido feito?

Primeiro não esquecer que temos também a obrigação de sermos sagazes. Lembrar que há grupos organizados e instituições que abertamente desejam implantar uma sociedade que virá a ser o oposto da antiga civilização cristã. São homens e mulheres, novos jacobinos que já criaram nova “lei dos suspeitos” e que anseiam por uma feroz inquisição laicista. Em suma, quem acredita que está nessa luta gigantesca tem a obrigação de fazer o possível e o impossível para impedir brechas que favoreçam os revolucionários progressistas.

Discriminação no ambiente de trabalho: o papel da empresa

Fiquemos com o exemplo 2. Bastaria que nossos bons constituintes tivessem lutado para acrescentar a palavra “injusta”. A redação ficaria: …e quaisquer outras formas de discriminação injusta”. Assim sendo, por exemplo, a Igreja não teria porque ficar preocupada em não admitir em seus quadros (escolas, seminários, hospitais) pessoas cujo comportamento estão em flagrante contraste com o ensinamento e a vida de Cristo. Nem teria que correr o risco de processos legais e injustos como os ocorridos na administração Obama contra freiras que não quiseram aceitar aborto ou distribuição de anticoncepcionais a seus funcionários.

Faltou sagacidade aos nossos constituintes. Ou sobrou para os adversários da família?

(1). O conferencista não deixou claro qual a posição dos muçulmanos com o novo texto. Só afirmou que houve nações que aceitaram a nova redação e, assim, foi obtido o número de votos necessários para que ela fosse aprovada.

(2) Já temos casos de juízes decidindo em favor da bigamia, do poliamor…E tem até discussão jurídica sobre isso…

https://www.ibdfam.org.br/artigos/1205/O+poliamor+e+sua+repercuss%C3%A3o+judicial

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